terça-feira, 21 de abril de 2009

Vitamina B(ellini)

Confesso que não conhecia a veia escritora de Tony Bellotto. Marido de Malu Mader e guitarrista da banda rock “Titãns”, Bellotto escreveu já três romances policiais (“Um Caso de Espíritos”, “Bellini e a Esfinge” e este “Um caso com o Demónio”) com o detective Remo Bellini como principal protagonista.

Esta edição da Quetzal dá-nos a oportunidade de conhecer um autor que aposta numa trama bastante eficiente e cativante. Apenas a escrita em português do Brasil se estranha de início mas depois se entranha e ficamos com a certeza da dinâmica da nossa língua materna ao serviço do "país irmão".

Em “Um caso com o Demónio”, Bellini, amante de Blues, cerveja, (ou devo dizer chope?) e comida italiana, investiga dois casos sem relação. O espectro de um manuscrito perdido do escritor Dashiell Hammett, nunca editado, e um assassinato de uma menina de 17 anos num colégio de classe média.

São Paulo e Rio de Janeiro juntam as mãos numa aventura que leva Bellini e comparsas a embrenharem-se num jogo de sedução criminosa que nos prende da primeira à última página.

Fã incondicional de Padura, Doyle e mestres do romanceio policial, fiquei bastante impressionado com este livro que se devora como se fosse um refrescante e vitaminado gelado numa tarde quente de verão.

Bellinni, Brasil, Bellotto e Blues. Bestial, não?

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Terra Pequena, Inferno Grande

A morte, o suicido, a perda, o isolamento não são nem nunca serão temas de fácil trato. A dor, ainda que esquecida ou ignorada é ferida que tarda a sarar. Por vezes fica. E mata.

No final dos anos 1990, na pequena povoação de Las Heras, Patagónia, a sul da Argentina, uma série de suicídios retirou a pacatez a um local ensombrado pelo vento constante e o esquecimento de Buenos Aires.

Apenas o petróleo fazia Las Heras viver, ter movimento, ser um ponto no mapa. A economia cresceu e a invasão migrante foi algo por demais evidente sem nunca existir um enraizamento social e cultural. Mas o declínio da exploração do chamado ouro negro trouxe mais esquecimento, incerteza, isolamento, dor, morte.

Intrigada com a pouca, ou nenhuma, atenção que a onda de suicídios teve por parte dos media, e de todos, Leila Guerreiro, jornalista do diário La Nación, rumou a Las Heras para falar com familiares, amigos, amantes dos mortos que, em média, tinham uma idade que rondava os 25 anos, e reconstituiu os acontecimentos trágicos.

Falou-se numa seita, em rituais satânicos, numa lista com os nomes das “vitimas” mas nunca ninguém confirmou nada nem sequer se elaborou uma listagem oficial com os falecidos.
O mistério ficou. Para sempre.

Desta investigação resulta um relato cru, intenso, real, carregado de dor, mas que é um retrato preciso e precioso de um pueblo que vive um quotidiano amorfo, sem futuro onde nada existe e para onde não se sabe se caminha. “Os Suicidas do Fim do Mundo” é como uma seta apontada a um alvo (in)definido.

As pessoas de Las Heras vivem das lembranças, do passado, do ente querido. Ao longo das páginas deste interessante livro, que chega a parecer “romanceado”, chegamos a encarar a dor como uma penitência com alguns, mas poucos, “culpados”.

A nós, chega-nos este excelente relato em forma de livro. A ler, definitivamente.